As palavras a seguir possuem um significado relativo. Pode ser que não sejam vistas como tão importantes por várias pessoas. Mas, para mim, elas ganharam um significado especial. São palavras que dão corpo para a memória da delicada cirurgia cardíaca que enfrentei aos 53 anos de idade. É como na expressão bíblica:
Lembra-te da minha aflição e do meu pranto, do absinto e do veneno.
Minha alma, continuamente, os recorda e se abate dentro de mim.
Quero trazer à memória o que me pode dar esperança.
Ou mesmo cantar, como o inesquecível Tim Maia:
Ah! Se o mundo inteiro me pudesse ouvir,
tenho muito pra contar, dizer do que aprendi […]
Mas, quem sofre sempre tem de procurar
Pelo menos vir a achar razão para viver.
Mas eu não posso ocultar o que mais me perseguiu nesse processo: a frustração e o medo.
Quando recebi a notícia da cirurgia, eu atravessava o melhor momento da vida, sobretudo profissionalmente. Estava na fase final do Pós-Doutorado, realizado nos Estados Unidos. Até aquele momento eu já havia ficado um período por lá, e minha pesquisa estava adiantada. Ao final do ano, retornaria a fim de cumprir a etapa final.
Diante da necessidade da operação, a primeira observação do médico foi: “você não poderá viajar”. Foi um verdadeiro “balde de água fria”. Entretanto, o mais grave para mim não foi a frustração. Estar diante da notícia de uma cirurgia cardíaca nos dá um medo enorme! Sei que alguns podem ponderar: “Hoje em dia tudo na medicina é moderno e eficaz”. Ou: “Você está nas mãos de Deus”. Ou ainda: “Você é forte”. Tudo isso é verdadeiro para mim. No entanto, não posso ocultar que o medo estava fortemente presente. Como na canção do Lenine:
O medo é uma linha que separa o mundo
O medo é uma casa aonde ninguém vai
Relato essas lembranças e sentimentos para revelar a fragilidade da vida. Nossos planos e tudo o mais que se dá no nível de nossa existencialidade, a exemplo de nossos desejos, sonhos e expectativas, nem sempre são possíveis de serem realizados.
Diante da falta de alternativas, tive de acolher a notícia. No entanto, o que eu gostaria mesmo era, pelo menos, poder adiar o processo cirúrgico. Acontece que a despeito de toda vontade e planejamento, os meus planos foram frustrados. E mais do que isso: também não queria precisar ter medo, não queria cirurgia, nem riscos, nem dor. Porém, eu sabia que vivemos na perspectiva da fé e que o contrário dela não é a descrença ou o ateísmo, como diz o senso comum. O contrário da fé é o medo.
Angustiado e temeroso, lembrava-me do Salmo 121:
Elevo os olhos para os montes:
de onde me virá o socorro?
O meu socorro vem do Senhor,
que fez os céus e a terra.
Assim, eu, como que me equilibrando em uma corda bamba, balancei sobre essas duas realidades da vida: o medo e a fé. E segui adiante…
Sugestão para leitura
“Tristeza, por favor vá embora…”. Disponível em: https://profanum.com.br/?p=1176#more-1176
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